terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

“Poéticas da oralidade: reinvenção e reescrituras”

Um evento que tem como objetivo trazer à tona a discussão sobre a cultura popular, muitas vezes deixada de lado pela academia e até pela própria sociedade, teve início hoje (07) pela manhã, no Centro de Arte e Cultura da UEPB, em Campina Grande. “Poéticas da oralidade: reinvenção e reescrituras” é o tema da 1ª Jornada de Estudo Internacional sobre Poéticas da Oralidade que a Universidade Estadual da Paraíba realiza até amanhã. A abertura contou com a participação do professor Rangel Junior e a conferência de abertura foi ministrada pela convidada Ria Lemaire.

poet3A organizadora do evento, professora Joseilda Diniz, lotada na UEPB através da Pró-reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (PRPGP), proferiu as palavras iniciais do evento, reforçando justamente o objetivo de trazer a discussão de um tema muitas vezes obscurecido. Em seguida, chamou à mesa o pró-reitor de Planejamento da UEPB, Rangel Junior, na ocasião, representando a reitora Marlene Alves. O professor comentou a presença de alguns artistas da terra, em especial da teatróloga Lourdes Ramalho, escritora conhecida de literatura e teatro popular que inclusive dá nome a um teatro em Campina Grande.

Rangel Junior também reforçou o caráter de cultura popular desta Jornada. “Vamos discutir a tradição da cultura popular, mas não somente. Temos a idéia de que tradição deve ser tratada como algo congelado no tempo. Creio que a tradição pode ser também renovada e atualizada, e aspectos deste evento confirmam isso, a começar pelo cartaz, pelas discussões, pelos convidados”, disse o professor. Ele acrescentou que a UEPB reforça seu caráter de contribuir com a cultura, através da socialização desta, e o faz através de eventos como esse, com a aquisição de um acervo como o que hoje forma a Biblioteca Átila Almeida e a construção do futuro museu do Artista Popular, às margens do Açude Velho, cartão postal da Serra da Borborema.

Ria Lemaire

poet2Antes do início da conferência, a professora Joseilda Diniz teceu algumas palavras sobre sua experiência com a professora Ria e a importância desta em sua carreira de pesquisadora. “Tive o privilégio de trabalhar com Ria Lemaire por 10 anos e por causa dela, fui empurrada, literalmente a revisitar minhas raízes. Ao chegar à França, pensei em fazer um trabalho em francês e vi que num lugar distante e estrangeiro, era muito mais valorizada a produção popular do que aqui em nossa terra”, relatou Joseilda.

Assim começou a parceria que resulta nesta visita da professora da Universidade de Poitiers-França, Ria Lemaire, hoje, em Campina Grande. Porém, a história desta pesquisadora com a cidade é antiga. “Para mim, é um prazer voltar aqui, uma vez que foi a primeira cidade brasileira a qual eu conheci melhor, ainda na década de 1970, trazida por um colega de origem holandesa que morava em Recife. Quando cheguei aqui, comi a famosa carne de sol, que até hoje é um dos meus pratos favoritos no Brasil”, comentou despojadamente. Suas vindas para esses lados não acabarão neste evento. No momento, ela escreve um livro com Lourdes Ramalho que deverá ser lançado em agosto deste ano. Até lá, outros encontros de pesquisa deverão surgir e o lançamento está previsto também na cidade.

Em sua fala, Ria Lemaire discorre sobre a cultura popular, especialmente no Brasil, que tem o propósito de que ensinamentos sobre seu próprio povo, sua gente, sua terra, sirvam a gerações futuras. “Com o passar do tempo, se percebeu que cultura popular não é coisa de gente pobre, da classe baixa. O sentido tradicional da palavra povo designava civilização, que por sua vez representava conhecimento. Com o tempo, esse sentido foi se perdendo e só no século XX, tentamos resgatar esse sentido original”.

poet5“Poetas como o paraibano José Alves Sobrinho usavam a palavra povo em seu sentido primeiro, de comunidade”, disse Ria, acrescentando que aqui mesmo, em Campina Grande, possuímos um espaço magnífico para a pesquisa popular: a Biblioteca Átila Almeida, da UEPB. Espaço que abriga o acervo do professor Átila Almeida, que já tinha uma parceria com o poeta José Alves.

Parecendo bastante atualizada, Ria Lemaire falou, ainda, da nova aquisição da Biblioteca, que foi o acervo de cordéis do professor Gilmar de Carvalho. “A pesquisa de Gilmar tem um caráter especial, pois foi baseada no diálogo com os poetas e é algo que vale a pena conferir”, disse a pesquisadora.

Demonstrando que até as grandes pesquisas e instituições reconhecem a importância de tal fato, em 1997, a UNESCO (sigla em inglês para Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) criou a distinção Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade, com o objetivo de reconhecer e preservar patrimônios, como o nome já diz, não-materiais, mas nem por isso, não menos importantes. A primeira lista de bens inscritos foi divulgada em 2001.

O Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade, também chamado Patrimônio Cultural Intangível da Humanidade, é uma honraria para a proteção e o reconhecimento do patrimônio cultural imaterial, abrangendo as expressões culturais e as tradições que um grupo de indivíduos preserva em respeito da sua ancestralidade, para as gerações futuras. São exemplos de patrimônio imaterial: os saberes, os modos de fazer, as formas de expressão, celebrações, as festas e danças populares, lendas, músicas, costumes e outras tradições.

poet4Ria Lemaire terminou sua conferência de abertura falando que a pesquisa em cultura popular está em processo, tentando encontrar seu paradigma. “Pesquisa exige método, que exige teoria, que exige fundamento. E esta prática está acostumada com outra formatação científica. O método de estudo com cordel, cantorias, entre outros, exige a observação de aspectos outros, que estamos em processo de construir. É um novo paradigma que estamos tentando desenvolver”, afirmou.

A manhã terminou com a mesa redonda “O universo de Lordes Ramalho”, com a participação da própria teatróloga, com mediação da primeira conferencista, Ria Lemaire, ambas parceiras em um livro, como já dito, a ser lançado ainda este ano. Entre os intervalos, podiam ser adquiridos diversos cordéis, expostos no hall, além da exposição de cordéis no jardim do Centro de Arte e Cultura da UEPB, que fica no Centro da cidade, ao lado do terminal de Integração. A tarde seguiu com um diálogo franco-ibero-brasileiro, numa mesa redonda com participantes de diferentes partes do mundo, mediado pelo professor Rangel Junior. A 1ª Jornada de Estudo Internacional sobre Poéticas da Oralidade segue até amanhã.


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