Esculturas de santos, presépios e oratórios em barro, madeira e cerâmica vão compor a exposição Arte Sacra Popular, que será aberta ao público na próxima quarta-feira (8) no museu de Arte Sacra em São Paulo. São 40 peças: além de esculturas, bordados, pinturas e madeira talhada.
A curadoria é de Edna Matosinho de Pontes, da Galeria Pontes. A maior parte das obras selecionadas é de artista do nordeste, como as do piauiense Mestre Dezinho, nas quais o regionalismo aparece em detalhes das saias dos santos, com cajus, folhagens e flores típicas. Peças de Alagoas, Pernambuco e Paraíba também aparecem. Embora em menor número, artistas de São Paulo e Minas Gerais estão representados.
Outra parte das obras expostas é de autoria desconhecida. São os chamados "ex-votos", trabalhos artísticos que expressam gratidão a um santo católico por uma graça recebida. Há também as chamadas "paulistinhas", imagens sacras em barro características da produção de São Paulo entre os séculos XVIII e XIX, de traços simples e sem formalidade na composição.
Serviço
Exposição Arte Sacra Popular Museu de Arte Sacra De 8 de junho a 7 de agosto De terça a domingo das 10 às 18 horas (bilheteria até as 17h30) Ingresso: R$ 6,00; R$ 3,00 (meia) Av. Tiradentes, 676 - Luz - São Paulo - SP Informações: (11) 5627-5393 ou www.museuartesacra.org.br
Segue abaixo texto da curadora da exposição,
O Contraponto do Despojamento
Esta é a primeira vez que o Museu de Arte Sacra abre as suas portas para uma exposição de arte popular. Isto é muito significativo pelo reconhecimento da sua importância. Ela não é, como alguns pensam, uma arte menor. Apenas se exprime através de diferentes vias, tem um caminho próprio.
A arte popular é a viva expressão da criatividade do nosso povo. Através da sua fantasia o artista reinventa a realidade, estabelecendo intima relação entre o real e o simbólico. Ao contrário da arte erudita a arte popular é uma produção espontânea, na qual não sobra espaço para a educação formal ou acadêmica. Quando algum tipo de transmissão de conhecimento existe, ocorre no máximo informalmente com outro artista/ artesão que funciona como iniciador.
Na arte popular há muito mais espaço para a inventividade e para o saber fazer pessoal do que na arte erudita. A imaginação é muito mais livre tanto na forma final do trabalho como nos meios que ele inventa para resolver os problemas de como fazê-lo. Como afirma J. A. Nemer [1] “há um alto grau de desafio aos cânones tradicionais da atividade plástica” já que esses cânones são conhecidos “senão através de observação superficial”. Assim, a carência de informação aliada a uma curiosidade fértil abre caminho para a criação.
No caso da arte popular de cunho sacro ela expressa, além disso, a devoção religiosa de quem produz ou de quem encomenda o objeto.
Dois significativos exemplos disso são as imagens denominadas “Paulistinhas” e os “ex-votos”. Paulistinhas são imagens simples, de barro ou gesso, desenvolvidas em São Paulo no século XIX, que as pessoas do povo costumavam ter em suas casas para devoção. Os ex-votos são representações de partes do corpo humano – pés, mãos, cabeça, etc – usados como forma de veicular um pedido ou um agradecimento de um milagre.
Outras peças que integram esta exposição tendem a exprimir de diferentes modos estas características da arte popular em geral.
A imagem com a beleza rústica da Virgem com o coração trespassado de setas de Antonio de Dedé nos remete ao ambiente tosco que ele vive e aos poucos recursos que dispõe para criar uma figura tão encantadora como essa.
Mestre Dezinho, criador do São Pedro e do São Francisco, tem o talhe na madeira elegante e inconfundível e influenciou toda uma geração de santeiros no Piauí.
Em Bento, outro escultor em madeira, vemos uma leitura bastante diferente para o seu São Francisco, assim como para a Virgem, mas igualmente bela.
A procissão de Maria do Socorro ilustra com a delicadeza da costura e do bordado uma das mais profundas tradições do nosso povo.
Os presépios têm um inconfundível toque de brasilidade seja ele feito de barro (João das Alagoas), de madeira (Artur Pereira, Miramar e Adão) ou de pintura (Fé Córdula).
Antônio Poteiro foi um mestre na arte da modelagem do barro e na pintura. Aqui revela através da Virgem moldada no seu estilo característico e na sua forte e vibrante Última Ceia a sua devoção.
O grande e renomado artista José Antônio da Silva, autor desta magnífica Via Sacra, dedicou muitas de suas pinturas à Arte Sacra.
O escultor Higino, nos seus anjos e na virgem policromados, faz uma interessante releitura do barroco mineiro.
Tota com suas figuras de cerâmica ao mesmo tempo fortes e delicadas criou toda uma série de santos que remetem ao expressionismo.
Willi de Carvalho, o mestre das figuras em miniatura, expressa o espírito de religiosidade e poesia ao mesmo tempo.
José Bezerra vive em contato com a natureza, isolado no Vale do Catimbó – PE, de onde retira a madeira para as suas esculturas.
Odon Nogueira segue a tradição de Poteiro ao escolher trabalhar com cerâmica criando, porem, um estilo próprio.
Costinha segue a tradição dos escultores em madeira iniciada com Mestre Dezinho mantendo a mesma elegância no entalhe.
Finalmente, Naninho esculpe na madeira uma das mais lindas representações religiosas, o Espírito Santo.
Esta mostra no Museu de Arte Sacra é composta autenticas manifestações da criatividade e da religiosidade do povo brasileiro.
Notas:
1. A mão devota – Santeiros Populares de Minas Gerais nos séc. XVIII – Ed. Bem Te Vi.
Edna Matosinho de Pontes
Galeria Pontes - Curadora da exposição
ARTISTAS QUE FARÃO PARTE DA EXPOSIÇÃO: